09Março2016

Maria Inês Meireles Junca

Quando o ciúme vira doença?

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Ciúmes

 

"O ciúme lançou sua flecha preta e se viu ferido justo na garganta."

Assim Caetano Veloso pensou o ciúme.  E quem nunca sentiu a garganta atravessada pela flecha preta do ciúme? Mas talvez, a grande questão seja até onde pode ir o ciúme.

Quando estamos apaixonados por alguém, queremos ser para aquela pessoa tudo ou mais do que ela é para nós. Sonhamos com sua admiração, respeito, amor, desejo e fidelidade. É aí que nasce o ciúme. Aquela sensação de medo de estar perdendo para outro, aquilo no que exigimos exclusividade.

 

O problema é que podemos ultrapassar, sem perceber, o limite do aceitável e muitas vezes o ciúme provoca um encontro com nosso pior pesadelo: o fim da relação.

 

Mas o que é o ciúme? Por ser uma sensação subjetiva e pessoal, não é simples descrevê-lo. Se cada um ama do seu jeito, o mesmo ocorre com o ciúme. Porém, podemos pensá-lo como uma sensação muito desagradável que mistura raiva, medo, desconfiança e menos valia. Muitas vezes o ciumento experimenta no corpo, literalmente, essa sensação. Boca seca, palpitação, sudorese, podendo evoluir para uma crise de ansiedade.

 

Podemos classificar alguns tipos de ciúmes que se apresentam, com frequência, na clínica psicanalítica. Meramente uma classificação didática, podendo aparecer junto e intercalado provocando uma grande confusão para quem sente e para quem se dirige.

 

- Ciúme Normal – aquela sensação de que preciso cuidar melhor do que penso que é meu. Pode ser um pensamento intruso, que nos leva a algum grau de insegurança e desconforto, mas serve para reforçar nossa necessidade de permanecer no jogo da conquista. Que nos faz buscar agradar a quem amamos e fazer uma leitura do feedback que ela nos dá, para avaliarmos nossos erros e acertos. Nesse caso o ciúme pode até ser bom.

 

- Ciúme Possessivo – Nesse caso o ciumento tem uma forte sensação do pertencimento do outro. É quando a relação fica objetificada. O outro me pertence como um objeto, é meu de direito. Assim eu vigio em vez de cuidar. São comuns cobranças, acusações e brigas. Essa forma de ciúme pode nem estar acompanhada de amor, tem mais a ver com posse. Extremamente prejudicial para a relação.

 

- Ciúme Projetivo -  A projeção é um conceito freudiano e seria um processo inconsciente, onde uma pessoa projeta na outra, características ou comportamentos que na verdade são seus, porém inaceitáveis em si.  O ciúme projetivo ocorre quando aquela pessoa que tem pensamentos e fantasias de infidelidade, começa a acreditar que está sendo traído. É como se não conseguisse acreditar que a parceira ou parceiro consiga ser fiel já que ele mesmo não é.

 

- Ciúme homossexual – Próximo ao projetivo, é o ciúme que ocorre quando alguém se sente atraído por outra pessoa do mesmo sexo. Por jamais ser capaz de admitir isso, desvia sua sensação para o companheiro. No caso um marido sentiria, inconscientemente: "Esse homem é tão desejável que é impossível que minha mulher não o queira. Certamente ela o quer".

 

- Ciúme patológico – Embora os três últimos tipos de ciúmes descritos aqui, possam ser destrutivos para o relacionamento, é o ciúme patológico o que mais preocupa. Esse é o ciúme que pode ser delirante quando a pessoa escapa da realidade e acredita fielmente em suas fantasias de estar sendo traído. Nesse caso ela tem certeza inamovível do fato. É como se ela tivesse visto e ouvido. Não comporta dúvida. Casos extremos podem chegar a séria descompensação psíquica, agressões e até assassinato ou suicídio.

 

Para não passar do ponto evocamos sabedoria socrática "conhece-te a ti mesmo". Não exite em buscar ajuda profissional, se perceber que seu relacionamento está sendo seriamente prejudicado pelo ciúme. Dê ao outro o privilégio da dúvida. Quase tudo pode ser resolvido com uma boa conversa e mudanças de atitudes. Não se culpe por aquele ciuminho normal, ele pode até ajudar a melhorar a relação, mas é bom estar atento aos excessos.